"Noiva havia quase cinco anos, Ismênia já se sentia meio casada. Esse sentimento junto à sua natureza pobre fez não sentir um pouco mais de alegria. Ficou no mesmo. Casar, para ela, não era um negócio de paixão, nem se inseria no sentimento ou nos sentidos: era uma idéia, uma pura idéia. Aquela sua inteligência rudimentar tinha separado da idéia de casar o amor, o prazer dos sentidos, tal ou qual liberdade, a maternidade, até o noivo. Desde menina, ouvia a mamãe dizer: “Aprenda a fazer isso, porque quando você se casar...”, ou senão: “Você precisa aprender a pregar botões, porque quando você se casar...”
A todo instante e a toda hora, lá vinha aquele – “porque, quando você se casar...” – e a menina foi se convencendo de que toda a existência só tendia para o casamento. A instrução, as satisfações íntimas, a alegria, tudo isso era inútil; a vida se resumia numa coisa: casar.
De resto, não era só dentro de sua família que ela encontrava aquela preocupação. No colégio, na rua, na casa de famílias conhecidas, só se falava em casar.“Sabe, dona Maricota, a Lili casou-se; não fez um grande negócio, pois parece que o noivo não é lá grande coisa”; ou então: “A Zezé está doida para arranja casamento, mas é tão feia, meu Deus!...”A vida, o mundo, a variedade intensa dos sentimentos, das idéias, o nosso próprio direito à felicidade, foram parecendo ninharias para aquele cerebrozinho; e de tal forma casar-se se lhe representou coisa importante, uma espécie de dever, que não se casar, fica solteira, “tia”, parecia-lhe um crime, uma vergonha.De natureza muito pobre, sem capacidade para sentir qualquer coisa profunda e intensamente, sem quantidade emocional para a paixão ou para um grande afeto, na sua inteligência a ideia de casar-se se incrustou teimosamente como uma obsessão."
Nenhum comentário:
Postar um comentário